Sustentabilidade: muito além do plano safra
Artigo escrito por: Fábio de Salles Meirelles
Presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP)
As iniciativas criadas pelo governo federal para estimular a produção sustentável foram as grandes marcas do Plano Safra 2023/24. Entre as novidades, está a alteração que estabelece a redução em meio ponto percentual na taxa de juros de custeio para os produtores rurais que possuírem o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e mais meio ponto percentual para aqueles que adotarem boas práticas ambientais.
Os benefícios são cumulativos e podem chegar a um ponto percentual. Na prática a medida alcança os produtores que tiverem CAR analisado e que comprovarem que desenvolvem, em suas propriedades, atividades sustentáveis, como produção orgânica ou agroecológica, utilização de bioinsumos, recuperação da vegetação nativa ou energia renovável. No caso do CAR, o plano impõe como condição que o imóvel rural esteja em situação regular frente à legislação ambiental de seus respectivos estados.
Criado como um instrumento do Código Florestal Brasileiro, o CAR tem a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo a base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.
A iniciativa do Governo Federal traz um novo foco para a política agrícola nacional ao incentivar e premiar a regularização ambiental e fomentar a adoção de práticas sustentáveis por meio dos instrumentos de crédito rural.
No entanto, a análise do CAR não depende dos produtores, sendo uma responsabilidade exclusiva dos governos estaduais e, por isso, o sucesso da medida depende das análises pelos órgãos incumbentes. Caso contrário, a redução das taxas de juros por boas práticas ambientais oferecida pelo Governo Federal não será efetiva.
O número de propriedades rurais analisadas no país é de apenas 3% dos imóveis cadastrados. Assim, embora positiva, a iniciativa pode não ser eficaz para os quase 7 milhões de cadastros existentes no CAR, uma vez que a grande maioria das propriedades aguarda pela análise dos órgãos ambientais estaduais.
Desde que essas medidas foram anunciadas, a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (FAESP) se demonstrou cética com a viabilidade da medida por acreditar que os produtores rurais não acessarão o benefício, considerando as conhecidas dificuldades estruturais dos órgãos estaduais para atender a demanda de processamento das análises.
Ao condicionar o desconto na taxa de juros à análise do CAR espera-se que os governos estaduais aprimorem suas estruturas e agilizem os processos de análise e validação, pois os produtores fizeram a sua parte ao realizarem o cadastro, mas não conseguem avançar na regularização ambiental por meio do PRA – Programa de Regularização Ambiental sem a necessária análise e validação do CAR.
Apesar de positiva a iniciativa do Governo de criar premiação à regularização ambiental e à adoção de práticas sustentáveis no âmbito dos instrumentos de política agrícola, na prática, a medida está muito distante de gerar resultados concretos em favor da sustentabilidade.
Um passo foi dado, mas outras medidas precisam ser implementadas para que o conceito de sustentabilidade seja fortalecido na agropecuária brasileira. A assertividade e a qualidade das políticas públicas de transição serão um diferencial estratégico para as nações, pois o caminho da economia verde e da sustentabilidade é irreversível. Com os atributos e recursos que dispõe, o Brasil não pode perder essa grande oportunidade de liderança global.